sexta-feira, 16 de março de 2012

A presa e o predador



O chapéu cinza, a calça de linho preta e um relógio de pulso prateado. Obrigado moça, olhou e sorriu pra mim, agradecendo pela gentileza em consentir que se sentasse ao meu lado e logo olhou para o outro. Em menos de três segundos olhou pra mim novamente, percebi apesar de possuir olhos de predador que ele me olhava, mas não disse nada, apenas me olhava. Voltou o rosto novamente para o outro lado então foi a minha vez de me virar e olhar. Vi suas mãos brancas e rugosas, manchadas pelo tempo e o pescoço franzido como papel dobrado em forma de leque sob a aba traseira do chapéu. Presas têm os olhos nas laterais da face para facilitar a percepção de um possível ataque do predador. O homem é um predador por natureza, assim como os felinos, olhos na parte frontal para fixá-los na presa sem dispersão na hora do ataque.
Ele era um homem predador por natureza que olhava sua possível presa.
Queria apalpar os meus seios, tinha certeza disso. O hálito levemente alcoolizado facilitou a sutil desinibição em olhá-los descaradamente. Fiz de conta que não percebi, mas as mãos dele se mexiam quase que involuntariamente em movimentos que denunciava seu desejo. Ele foi discreto, educado, no entanto o desejo era de tamanha transparência que não havia discrição suficiente que o entocasse nem debaixo do chapéu cinza nem debaixo das calças pretas.
Ele era um homem predador por natureza que olhava sua possível presa não como um felino, mas como homem que era, corroído pelo tempo, corrompido pelas etiquetas sociais, pervertido pelo instinto natural de reprodução, demolido pela falência corporal e tomado pelo desejo que há tempos se tornara algo irreal. Aparentava já se contentar com desejos não realizados. Parecia feliz em somente imaginar sensações. Era o que o movia a caminho do restante de seus dias e o que pulsava efervesceste sob a pulseira do relógio prateado.

Paula Miasato

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